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Histórias estampadas

  • Foto do escritor: Daniela Ventura
    Daniela Ventura
  • 10 de out. de 2016
  • 2 min de leitura

Atualizado: 22 de out. de 2020


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A nossa história e vida está escrita no nosso corpo que é como um livro, um mapa, aberto – que só nós conseguimos verdadeiramente decifrar. Cada ruga, cabelo(s) branco(s), cada sinal, cicatriz, dente torto, mais escuro ou falta dele: transporta-nos para uma época, altura, idade ou circunstância. O relógio continua a funcionar, com mais ou menos corda, e nós continuamos a fluir, com ele, pela vida.

Podemos deparar-nos com os nossos traços de história todos os dias. Mas não são só eles que estão impregnados da energia de momentos vividos que nos tornam quem somos. Há outras coisas que nos falam, em sussurros, sobre outros tempos: e a história que nos vão segredar ao ouvido, pode nem sempre ser a nossa. Sempre que visito um monumento ou local de antigamente, sinto algo no ar que me põe, automaticamente, em modo contemplativo – quase que apático. É como se os meus sentidos e energia se tornassem pastilha elástica e se moldassem a tudo o que aquelas paredes testemunharam, escutaram e a tudo o que se por ali viveu. Começo a imaginar… e viajo.

Ontem, deparei-me com um lugarejo assim. Algures, perdida perto de Vila Real, numa aldeia, uma casa descansava – ainda com janelas e telhado – de porta fechada.


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Por entre silvas, entrei. No interior, vários relógios espalhados – principalmente num dos quartos pequenos e toscos – riam-se de nós, do Tempo. Um deles ainda mostrava toda a sua vitalidade por detrás do seu pujante tic-tack. Olhando para as paredes, pensei que histórias escondiam: quantos filhos nasceram ali? Quantos netos lá pernoitaram? Que odores dançavam dentro daquele fumeiro? Quantas vezes foi despejado aquele penico que repousava, ainda, debaixo de uma cama cujo colchão era o banquete vivo da bicharada?


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Pelas paredes, crenças impressas rejubilavam preces fervorosas que talvez tenham sido ouvidas: a fome que não foi grande naquele inverno, a praga que não atacou as árvores de fruta, os grãos que – dia após dia – continuavam a crescer na arca onde estavam, religiosamente, guardados. O vinho… que alegrava vidas mais tristes e aquecia tripas friorentas. Quem sabe?… Um Santo António erguia-se, majestoso e cuidador do menino que carregava nos braços, contudo, sem cabeça. Alguma discussão que se lha fez perder? Talvez tenha ficado demasiado tempo de castigo, cabeça para baixo, por não ter arranjado casamento às donzelas da casa?


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Nesta casa de gente simples: pequena e despretensiosa, um espelho pendia à porta. Seria para o agricultor se mirar, ao raiar da madrugada, antes de sair para a lavoura barriga cheia de sopa de feijão? Ou seria para ao domingos, antes de irem para a missa, poderem atestar que tudo estava nos devidos conformes?


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